terça-feira, 18 de novembro de 2014

8ª Postagem: As mulheres da seda

    Nessa semana, o blog "Bioquímica Histórica" vai aprofundar em uma área da medicina em que são mais prováveis a existência de casos diferentes dos cotidianos: a psiquiatria e a psicanálise.
Capa O grito da seda
Temos como análise os casos clínicos que levaram o psiquiatra Gatian de Clérambault a escrever os famosos textos na psiquiatria chamados "Paixão erótica dos tecidos na mulher" que podem ser encontrados no livro "O Grito da Seda", em que a capa está aqui ao lado.
    Como o próprio nome já remete, tratam-se de casos clínicos em que mulheres foram detidas pela polícia em Paris enquanto tentavam furtar pedaços de seda em grandes lojas da cidade. Tais mulheres foram atendidas na Enfermaria de Alienados de Paris e, com o decorrer do acompanhamento clínico, descobriu-se um obsessão cleptomaníaca por tecidos nas pacientes, na qual a hipótese criada foi que elas realizavam essas ações por causa da paixão arrebatadora por tecidos, utilizados para atingir o gozo sexual, sendo esse o principal sintoma de suas doenças histéricas, caracterizada como "fetichistas dos tecidos".
    Antes de tudo, é importante citarmos que a psiquiatria atual considera que todas as pessoas possuem um detrminado grau de fetichismo dentro delas, sendo normal uma pessoa sentir-se atraida por uma característica da outra pessoa ou por algum tipo de adereço. O que inicia a destoar do normal é casos em que o objeto substitui a outra pessoa em graus de importância ou quando a pessoa não consegue o prazer sexual sem o objeto em si, nas quais o fetichismo substitui o ato sexual em si.
    "Eu sinto um inchaço da garganta e desfaleço. Quando eu posso pegar o tecido, eu o amasso e isso me causa um aperto particular no estômago, em seguida, eu experimento uma espécie de gozo que para completamente minha respiração, me sinto embriagada, não posso me conter."
     O relato acima representa um dos depoimentos das pacientes que encontram-se no estudo. Os depoimentos relevam claramente que elas encontravam-se em estados de embriaguez e de vertigem ao realizarem o ato que, elas mesmas, não sabiam o motivo por trás, mas apenas o faziam. Havia uma grande dificuldade na época de sistematizar os achados clínicos e dar um laudo sobre as pacientes, pois, para a época, os sintomas eram uma novidade e o fetiche era condenado pela sociedade.
     Eis aqui que entra um dos objetos da Psicanálise – o inconsciente – objeto que ocupa outro lugar que não se restringe às especificidades pretendidas pelas ciências. Sabe-se que, para a psicanálise, a descoberta do inconsciente foi, por natureza, um golpe narcísico sobre as leis irrefutáveis da ciência clássica. Além disso, as mulheres já gozavam de um lugar de enigma na teoria psicanalítica, já que, segundo Freud, elas, por serem teorizadas a partir da referência fálica, padeciam de uma fragilidade superegoica e de pouco senso de justiça. 
     As pacientes tinham em seus prontuários:  histérica, amoral, delinquente, paixão erótica pela seda, impulsos cleptomaníacos, furtos.. Além disso, podemos ver que um uma das observações, a paciente, que teve sua identidade preservada, era classificada como: histerica, precoce sexualmente, frigidez alegada, paixão pela seda, delírio do toque, esboço do masoquismo, toxicomania, amoralidade, delinquência banal, impulsos cleptomaniacos com participação genesica. Uma das pacientes admite ter casado apenas para poder utilizar um vestido de seda preto, mas que, para ela, os homens eram todos iguais e ela não os suportava.
     As pacientes foram classificadas como histéricas e neuróticas, sendo essa classificação maior que fetichistas, mas não o suficiente para serem consideradas perversas ou psicóticas
     No caso em questão, um dos pontos interessantes é o gozo que as mulheres sentiam com a seda, mesmo quando ouviam a palavra "seda", sendo o ápice durante o furto desse material. O orgasmo, também denominado de êxtase, gozo ou ápice, acontece quando os estímulos sexuais alcançam a sua atividade máxima, quando toda tensão sexual é liberada. Ocorre o que se denomina de plataforma orgásmica, que é a congestão vascular profunda do clitóris, pequenos e grandes lábios do terço inferior da vagina. Nessa região acontece uma série de contrações rítmicas e involuntárias.
     No cérebro a região sexual localiza-se no hipotálamo onde estão localizados os neurotransmissores que ativam e que inibem o desejo, chamados de centros póstero-laterais e centros ventro-mediais respectivamente, agindo de forma antagonista. Esses centros estão relacionados aos centros do prazer e da dor. Por esse motivo quando o centro do desejo é acionado, ocorre a ativação do centro do prazer, proporcionando a pessoa uma sensação prazerosa. Já quando o centro da dor é ativado, pode haver uma inibição do desejo pelo centro relacionado.
     As endorfinas são compostos químicos produzidos pelas células cerebrais que proporciona um efeito de euforia, bem estar e alívio. Essa substancia é liberada no Sistema Nervoso Central (SNC) e vai ao mesmo tempo estimular o centro do prazer e inibir o centro da dor. Já quando se estimula o centro da dor, a produção de endorfina é bloqueada. Na fase do desejo, também estão envolvidos alguns hormônios, estrógeno e testosterona na mulher e no homem apenas a testosterona que vão agir nos centros sexuais do hipotálamo. Na mulher na carência de testosterona o estímulo sexual pode ser dado pelo Hormônio Luteinizante (LH), secretado pela hipófise anterior.
    O tratamento desses casos deve ser feito através e somente com o aompanhamento de um psicoanalista, pois é necessário uma terapia cognitivo-comportamental e uso de medicações específicas.
Fonte:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-65642010000300008&script=sci_arttext
http://books.google.com.br/books?id=ClZdC5cuMnIC&pg=PA84&hl=pt-BR&source=gbs_selected_pages&cad=3#v=onepage&q&f=false
http://pt-br.infomedica.wikia.com/wiki/Fisiologia_do_Ato_Sexual




8 comentários:

  1. Sabe-se que a endorfina tem uma potente ação analgésica e ao ser liberada estimula a sensação de bem-estar, conforto, melhor estado de humor e alegria. Assim, ela primariamente tem funções benéficas ao organismo e sua liberação estratégica naturalmente estimula atividades corporais encorajadas, como atividade sexual e exercícios físicos. Entretanto, no caso da postagem, a liberação de endorfinas tornou-se necessidade das "mulheres da seda" para atingir a felicidade, configurando o processo patológico. A existência de uma possível dependência causada, pela prática de atividades físicas, por exemplo é atribuída às concentrações elevadas de endorfina circulante em atletas. Tal fato explica as sensações desagradáveis com desconforto, irritabilidade, ansiedade, depressão e alteração de humor em praticantes que por algum motivo deixaram de se exercitar.
    Fonte: http://www.assessocor.com.br/noticias.aspx?__idNot=230

    ResponderExcluir
  2. É interessante saber dessa relação de excludência e inibição entre os centros do prazer e da dor. Dessa forma, é possível perceber o quão diferente é a experiência de uma mulher que escolhe seu parceiro e faz sexo voluntariamente (prazer) e uma outra mulher que é estuprada (dor). Também é interessante perceber que as áreas de prazer sexual (ou dor) variam conforme cada indivíduo. Por exemplo, homens heterossexuais certamente sentem prazer no pênis e no ponto G, onde são encontrados receptores nervosos especiais para isso. Já homens homossexuais sentem prazer no ânus, região que, em homens heterossexuais, certamente causaria dor e desconforto. Esse fato, apesar de não ser totalmente explicado pela ciência, é algo hoje normal e socialmente aceitável. Dessa forma, tanto esse fato como o conteúdo dessa postagem vão ao encontro da ideia da existência de uma evidente individualidade entre cada ser humano. Cabe então aos cientistas compreender o motivo da existência desses ''fetiches sexuais'' e à sociedade respeitá-los.
    Fonte: Aulas de Educação Sexual no Ensino Médio

    ResponderExcluir
  3. O mecanismo do prazer é realmente muito interessante e o neurotransmissor responsável por essa sensação boa é a dopamina. Muitos experimentos com animais mostraram que quando o animal tem a região do cérebro responsável pelo prazer estimulada devido a alguma ação, o animal voltava a fazer a ação repetidas vezes sem parar. Outra questão importante que a liberação de dopamina traz é a importância de novos objetivos. Quando realizamos sempre uma mesma tarefa, que pode ter sido prazerosa inicialmente, nosso cérebro tende a se acostumar com ela, e por isso acaba interpretando como algo corriqueiro. Sempre que colocamos um objetivo novo o cérebro começa a liberar dopamina a cada momento em que fazemos algo que nos faz ficar mais perto deste objetivo. Ter novos objetivos, ainda que pequenos, em mente é imprescindível para evitar ciclos viciosos de dopamina e melhorar a qualidade de vida.

    Fonte:
    http://www.onacional.com.br/variedades/36534/dopamina+rotina+e+o+ciclo+vicioso+do+prazer

    ResponderExcluir
  4. O foco paralítico no fetichismo envolve o uso de objetos inanimados. Entre os objetos de fetiches mais comuns estão calcinhas, soutiens, meias, sapatos, botas, ou outras peças do vestuário feminino. Há casos raros como o uso de tecidos. O indivíduo fetichista frequentemente se masturba enquanto segura, esfrega ou cheira o objeto do fetiche ou pode pedir que o parceiro use os mesmos durante seus encontros sexuais. Em geral, o fetiche é exigido ou enfaticamente preferido para a excitação sexual, podendo os homens, em sua ausência, apresentar disfunção erétil. Deste modo, o fetichismo considerado como desvio sexual, também aparece como ingrediente de outros comportamentos sexuais de caráter mais complexo, como as práticas sadomasoquistas, como visto em aula do professor Osmar. Nesse tipo de desvio, a atividade sexual se cerca de rituais em que intervêm objetos que atuam como estimulantes eróticos, com uma carga de significado específica.

    Referências:
    http://www.psicologia.pt/artigos/textos/TL0224.pdf

    ResponderExcluir
  5. A situação mostrada na postagem tem seu teor reforçado quando se leva em consideração a diferença quanto à sexualidade e o desempenho sexual de homens e mulheres. Enquanto a sexualidade masculina é definida pela lógica do desempenho, medido pela ereção e tratado com medicamentos e técnicas que resolvam o problema específico da disfunção erétil, a sexualidade feminina é apresentada como um fenômeno complexo e intrigante, não redutível a uma função orgânica específica. Essa “incógnita” que é a sexualidade feminina é um fator a se considerar no caso das "fetichistas dos tecidos". A sexualidade masculina é "naturalmente" pensada como independente da relação com parceiras, um impulso autônomo, incontrolável, independente de relações ou afetos. A mulher continua sendo vista como um ser eminentemente "relacional". Sua sexualidade não existe como impulso autônomo, separado da conjugalidade (ou das relações). Essa condição, evidentemente, afeta as mulheres pelo preconceito que as sociedades machistas e patriarcalistas incidem sobre elas, o que dificulta os tratamentos e os estudos. Uma informação importante sobre esse mecanismo do prazer é que a sensação de prazer pode ser distinguida pelas expressões faciais e atitudes do animal após sua exposição a um estímulo hedônico. Tais expressões são mantidas mesmo em indivíduos anencefálicos, sugerindo que o "centro de recompensa" deva se estender até o tronco cerebral. Acredita-se que emissões aferentes do núcleo acumbens em direção ao hipotálamo lateral e ventral, globo pálido e estruturas conectadas nessa mesma região cerebral estejam envolvidas nos circuitos cerebrais hedônicos.
    Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89102011000400012&lang=pt
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832008000200003&lang=pt

    ResponderExcluir
  6. Ebing, psiquiatra alemão, classificou como fetichismo “a associação de desejo ardente com a idéia de certas partes da pessoa feminina, ou certos artigos do vestuário feminino” Sendo assim, a caso dos tecidos entra nessa definição, pois está claramente associado ao vestuário. Fetichismo é, ainda de acordo com Ebing, “o desvio do interesse sexual para algumas partes do corpo do parceiro, para alguma função fisiológica ou para peças de vestuário”. A partir dessa definição, fica evidente a importância que é dada não só ao aspecto parcial do corpo feminino, bem como à capacidade que as peças do vestuário apreentam de funcionar como elementos aprisionadores do desejo. Embora se encontrassem descrições de fetichismo apenas no caso dos homens, Clérambault(psiquiatra citado na postagem e autor do texto em questão) pregava que as breves conclusões a que havia chegado, com seus estudos sobre essa peculiar relação entre essas mulheres e os tecidos, podiam ser colocadas, por afinidades diagnósticas, ao lado do fetichismo verdadeiro, apresentado pela literatura médica como encontrado somente nos homens: “Os autores clássicos dizem unanimemente que o fetichismo ainda não foi constatado nas mulheres; essa afirmação seria inexata se fosse preciso ligar nossos casos ao fetichismo; e, se não os ligamos, seu lugar não será marcado em nenhuma parte”.
    Referência: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rel/v1n2/v1n2a02.pdf

    ResponderExcluir
  7. No fetichismo, o meio preferido ou único de atingir satisfação sexual é manipulando e/ou observando objetos, não animados, intimamente associados ao corpo humano. Não se sabe ainda porque certos estímulos são mais condicionáveis que outros, mas é possível que isso tenha a ver com uma relação particular com objetos ligados a vínculos afetivos desde a infância. É bem provável que o objeto fetichista tenha um significado que vai para além do condicionamento de um estímulo qualquer.
    Fonte:
    http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25340211

    ResponderExcluir
  8. É interessante falar que, em psicologia, o fetichismo é uma parafilia. O objecto do fetiche é a representação simbólica de penetração, tem conotação sexual, é um objecto parcial e não representa quem está por trás do objecto. Os fetiches mais comuns na sociedade ocidental são os pés, os sapatos e a roupa íntima. Fantasias fetichistas são comuns, mas não chegam a ser um transtorno a não ser que levem a rituais que sejam tão compulsórios ou inaceitáveis a ponto de interferir com relação sexual e causar angústia no indivíduo. É importante frisar que os fetichistas são pessoas que não causam mal a ninguém e muitas vezes o fetiche pode ser considerado somente uma ''preferência sexual''.
    fonte: http://consultoriodepsicologia.blogs.sapo.pt/86368.html

    ResponderExcluir